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Lição 1ª - O Surgimento da Teologia da Prosperidade




TEOLOGIA DA PROSPERIDADE




Escrito por Ezequiel Carvalho, professor da classe dos jovens


Antes de analisarmos as questões históricas ou sociológicas envolvendo a chamada teologia da prosperidade, ou nos debruçarmos numa análise teológica do tema, devemos ter em mente o sentido já muito esquecido do significado da palavra prosperidade, dentro de uma perspectiva bíblica.

Prosperidade é uma palavra derivada da expressão latina prosperare, que significa basicamente quatro coisas: progredir, melhorar de condição, crescer e enriquecer. Obviamente com o advento do capitalismo, a palavra se alinhou com a quarta definição. Portanto quando se diz hoje que alguém é próspero na verdade se quer dizer que a pessoa é endinheirada, ou melhor, financeiramente bem sucedida.

A Bíblia, no entanto, tem outra ideia sobre a prosperidade. É um engano dizer que o Evangelho não nos promete bênçãos. Mas a benção do Evangelho é muito maior do que o dinheiro, por certo é aquilo que Paulo cita: as coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, e não subiram ao coração do homem, são as que Deus preparou para os que o amam (I Coríntios 2:9).

Ora aquilo que o dinheiro pode conseguir limita-se a vaidade humana. Porque nada temos trazido para o mundo, nem coisa alguma podemos levar dele. Mas quem corre atrás de riquezas jamais se farta. Por isso diz o sábio: Doce é o sono do trabalhador, quer coma pouco, quer muito; mas a fartura do rico não o deixa dormir. Precisamente por causa disso: a prosperidade do mundo é passageira.

Não é assim, contudo, o dom de Deus, a prosperidade segundo Cristo, a benção que ele pode nos ofertar. Pelos seus ricos méritos, Cristo é detentor de um grande tesouro. O seu tesouro é regeneração da humanidade. Somente Jesus pode colocar dentro do homem a natureza divina, como disse Pedro: Pelas quais ele nos tem dado grandíssimas e preciosas promessas, para que por elas fiqueis participantes da natureza divina, havendo escapado da corrupção, que pela concupiscência há no mundo (II Pedro 1.4).   

Dito isso, chegamos a um ponto chave para o nosso entendimento sobre a teologia da prosperidade. Ela se baseia em dois pilares distintos, mas ao mesmo tempo complementares: o acúmulo de riquezas materiais, como uma recompensa natural aos filhos de Deus, e um endeusamento do homem, pois ele pertence à natureza divina. Percebe-se que há um desvirtuamento da doutrina bíblica sobre esses temas, como apresentado acima, e que existe também resquícios do secularismo e do paganismo dentro da Igreja de Cristo.

Tarefa complicada seria, contudo, fazermos uma genealogia segura e inequívoca das ideias instituidoras dessa teologia. O comentarista desse trimestre, o pastor, teólogo e filósofo, José Gonçalves nos traz a teologia da prosperidade como que um desdobramento do gnosticismo.

O gnosticismo pode ser definido como uma teoria religiosa que junta aspectos do cristianismo com o judaísmo, filosofia grega e paganismo, tendo o intuito de resolver basicamente duas questões da filosofia platônica: a existência do mal e do sofrimento no mundo e o dualismo matéria e espírito (sendo a matéria algo ruim e o espírito bom).

Não cabe pelo foco e encurtamento de espaço, destrinchar ponto a ponto o gnosticismo. Apenas é necessário descrever como o comentarista associa o gnosticismo com o assunto proposto. Para ele como essa teoria religiosa nega a existência do mal e do sofrimento, o nosso pastor associa esse enfoque a confissão positiva e ao otimismo desenfreado da teologia prosperidade, além de que ele percebe que em ambos os casos a salvação da alma recebe um valor menor do que é apresentado na teologia tido como ortodoxa.

José Gonçalves tem razão. Mas penso que ele deixou passar pontos de influência mais significativos para a visão teológica atual. Se ele fala de “modismos”, não podemos concluir que uma doutrina apresentada no tempo de Cristo seja um modismo. Algo também importante é que os fundadores da teologia da prosperidade são pessoas que na sua grande maioria viveram no século passado (E. W. Kenyon, Kenneth E. Hagin, Kenneth Copeland).

Por essas razões, acredito que, tirando a questão da confissão positiva, o nosso foco deveria recair sobre a ascensão da sociedade burguesa no que tange ao materialismo e ao humanismo no que se refere a “divinização” do homem.

Com o advento da classe burguesa houve uma mudança de valores. Nada daquilo que João Batista disse: quem tiver duas túnicas, reparta com o que não tem, e quem tiver alimentos, faça da mesma maneira (Lucas 3.11), ao contrário quem vive no capitalismo não empresta por espontânea vontade, no máximo aluga com juros.

E por quê? Porque é necessário ter dinheiro, ostentar posses. A sociedade capitalista é a sociedade de consumo. Como apresenta de forma bastante inteligente Camila Fernandes:

"Com a necessidade de fazer o mercado girar, e atingir níveis antes não imaginados, a sociedade capitalista criou o mito do consumo como algo bom e imprescindível para os cidadãos. Para isso, a capacidade aquisitiva se tornou um meio de classificar as pessoas, bem como a quantidade e a qualidade do que estas consomem.  No momento em que o consumo se torna a base da divisão populacional, consumir tornou-se uma forma de prestígio social. Então, ao consumir algo pertencente a uma classe superior as pessoas sentiam-se felizes e incluídas na sociedade. Desse modo, foi criado o mito do consumo e a principal característica do capitalismo: a obsessão por este consumo."

Mas isso não existia nos tempos bíblicos, não se é condenado à avareza? Sim, de fato. Mas o que existe hoje é que a avareza, a ambição, o egocentrismo são tidos como virtudes. Hoje se agradece bem mais nas igrejas, o fato de uma pessoa ter ganhado uma promoção no trabalho, a aquisição de um imóvel, a compra do carro do ano, do que uma benção espiritual. E disso não podemos ser hipócritas, pois sabemos que já estamos de certa forma todos contaminados. Como Ló, sentimos indignação em relação aos pecados de Sodoma, mas pouco nós fazemos para escapar dela.

É necessária uma forte crítica a essa posição que a Igreja de Deus vem tomando, muito mais próxima daquilo que foi dito sobre a igreja em Laodicéia do que da igreja em Filadélfia. Temos nos achado ricos, enquanto somos pobres. Deus não vê como o homem vê. Para Deus Lázaro era rico, embora mendigasse, enquanto a igreja em Laodicéia era miserável, enquanto se achava rica, de que nada faltava.

Por outro lado, temos o humanismo. O humanismo é uma palavra que designa várias acepções. Existe um humanismo cristão, Erasmo de Roterdã e Lutero foram dois grandes humanistas. O humanismo foi importante para a Reforma, pois permitiu uma crítica mais contundente as tradições religiosas extrabíblicas. Isso foi fundamental para o avanço do protestantismo. Em compensação a Igreja ganhou novos desafios.

O humanismo aliado com o materialismo, fez com que o homem perdesse o apreço e a reverência por Deus. Hoje ele se acha senhor de si, e parece não conseguir compreender a necessidade da salvação. É como se Deus vivesse para o homem, somente existindo por ele. Charles Spurgeon, o príncipe dos pregadores, fala assim:

Jesus não morreu por causa da nossa justiça; morreu isto sim, por causa dos nossos pecados. Ele não veio salvar-nos porque éramos merecedores de salvação, mas porque éramos absolutamente indignos, arruinados e perdidos. Ele não veio à terra por qualquer razão que se achasse em nós, mas apenas e tão somente por razões que Ele encontrou nas profundezas de Seu divino amor. Em tempo oportuno, Ele morreu por aqueles a quem descreve não como piedosos, mas como ímpios, aplicando a eles o adjetivo mais negativo que poderia escolher (Escapando da Sedução – Retorno ao Cristianismo Bíblico, Dave Hunt, Chamada da Meia-Noite, p. 23)

Atualmente o cristianismo segue o sentido oposto daquele pregado pelos apóstolos, quando as pessoas ao ouvir o Evangelho caíam em lágrimas, suplicando o perdão de Deus. Hoje não, o cristianismo pregado por muitas igrejas é o do homem no centro de todas as coisas, aquele do qual o Supremo Deus suplica a sua aceitação, implora pelo um pouco de atenção. Não é esse o cristianismo bíblico.

A Igreja hoje tem o maior desafio de todos os tempos, achar a sua própria identidade. Unir-se em torno de Cristo e não contender por motivos mesquinhos. O materialismo está impregnado no homem moderno com uma força maior do que estava o paganismo no homem do tempo de Cristo.

Cabe a Igreja a luta. Temos, porém a promessa da vitória. As portas do Inferno não prevalecerão. Devemos tomar essa promessa e invadir o terreno do inimigo. O que é de Deus o Maligno não toca, não, pois temos a mesma promessa de Abraão.  

         


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